ENTREVISTANDO OS... BASTARDOS DE LEMMY KILMISTER?


Tudo o que se espera de uma pauta é que... dê certo! Óbvio! Ainda mais se o entrevistado for um músico gringo e o encontro não estiver oficialmente agendado – e, mesmo assim, você quer encarar o desafio. É nessa hora que vemos o quão religioso podemos nos tornar. É um tal de reza daqui, figas dali, pensamento positivo, rituais mil... só para que realmente se consiga bater um papo com o camarada.

Há quem pense que só porque o veículo em que trabalhamos é conhecido mundo afora as coisas são bem fáceis. Basta um telefonema e pronto! Lembro que depois da entrevista com o Slash recebi algumas mensagens curiosas, a mais engraçada foi a de uma fã pedindo desesperadamente o msn dele ou então que eu passasse o dela a ele (!!!). "Ah, claro! Pode deixar. É só ele aparecer online pra mim que eu vejo isso", respondi.

Bem, é verdade que até há bastante caso em que isso funciona, em que conseguimos uma entrevista dando um telefonema ou enviando um e-mail diretamente a quem interessa. Mas, no geral, é osso (traduzindo: difícil pacas – inclusive com músicos brasileiros). Em 2009, quando o Motörhead veio ao Brasil, tentei bater um papo com o figura Lemmy Kilmister. Foi uma campanha intensa e sem pausa pra descanso (incluindo ter que choramingar até mesmo por uma mísera declaração. Tudo por um texto com informações legais – sina do jornalista).

Eu queria muito falar com o Lemmy, não apenas por ele ser quem é e ter a história que tem com a banda, mas por ter sido roadie de ninguém menos que Jimi Hendrix. Contudo, assim que vi que não iria rolar a pauta do jeito que eu estava tentando, decidi fazer uma entrevista com o roadie do guitarrista Phil Campbell (que também estava na minha mira). A ideia fazia sentido, já que, naquela época, a Guitar Player publicava uma série especial sobre os roadies (que são os técnicos que trabalham pesado e seguram a bronca dos músicos nos shows: trocam cordas que arrebentam, afinam os instrumentos, montam os equipos, acendem os cigarros dos astros e também os reabastecem de cerveja e whisky... e água).

Acabei conseguindo marcar o papo com o roadie do Campbell, que, por sinal, era um brasileiro. Estava indo bem na minha investida, comemorei. O papo seria durante a passagem de som, no local do show (Via Funchal, em São Paulo) – melhor ainda! Lá fomos nós, eu e o Pepe Brandão (fotógrafo da revista para essa matéria). É claro que eu iria fazer de tudo para, uma vez lá dentro, conseguir falar com os músicos.

Ok, fiz a entrevista com o roadie e pedi uma forcinha a ele para chegar ao Lemmy, mas... imprevistos! Por conta de um problema de logística, os equipamentos da banda demoraram a chegar na capital paulista (estavam em Recife e havia dado algum galho no transporte). Assim, as coisas ficaram corridas, o show iria atrasar e os músicos estavam de ovo atravessado e só apareceriam somente na hora de pisar no palco.

Descobri isso com o simpático Tim Butcher, roadie do Lemmy há anos (foi a única ajuda que tive do outro roadie, o nosso conterrâneo: me apresentar a essa figuraça). Acabei batendo um papo legal com esse inglês, que é um sujeito tranquilo e bem-humorado. Expliquei a pauta, contei o quão importante seria conversar com o "patrão" e, então, ele me disse do galho que havia dado. Foi honesto. Aliás, honesto e gente boa, pois, a certa altura, virou para nós e disse:

- Ei, vocês querem ver os baixos que o Lemmy vai usar? Podem fotografá-los e tal, se quiserem.

- Opa, claro! – respondemos.

- Cheguem aqui!

Fomos até o palco, que tinha parte do equipamento que já havia chegado. O Butcher abriu dois cases e lá estavam os lendários Rickenbacker de Lemmy Kilmister – ou melhor, os seus modelos rebatizados "Rickenbastard". Sensacional! Para a nossa surpresa, o cara nos entregou cada um deles. Foi estranho e legal, já que poucas horas depois veria o líder do Motörhead mandando ver no show com aqueles mesmos baixos. A mulher do Pepe estava conosco e tirou essa foto aí – "crássica" pra mim.

Perguntei ao Butcher que tipo de distorção o baixista usava, já que a banda é famosa por fazer um dos shows mais altos (altura do som) do planeta e ele me disse que não usava nada. Era volume no talo mesmo. Caramba!!

E isso foi o mais próximo que consegui chegar de Lemmy para a entrevista que pretendia: os Rickenbastards. Evidentemente, a pauta não deu certo, mas depois refleti a respeito. Mesmo que por desencargo mental, temos que fazer o exercício de sempre encarar a coisa sem muito radicalismo. Afinal, dá para encontrar algo de positivo em quase tudo – ainda que seja a lembrança de um momento inusitado como esse que contei.

Henrique Inglez de Souza

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